Papo de Sambista com Carlinhos do Salgueiro ...

14/01/2015 19:54

 

Hoje é dia de Papo com Sambista ...

 

Daí surge a duvida:

 

“Pra ser sambista precisa ter DNA de Sambista?”

 

Acreditamos que a Resposta é NÃO !

 

Teremos sempre os novos Sambistas, pois a nossa cultura é popular e sempre será contagiante, uma criança mesmo que no ventre quando ouve o soar de um tamborim irá sempre se remexer e se apaixonar.

 

O que precisamos é que quem tem a obrigação de manter essa Cultura Popular são os que já tem o DNA ... e para isso iremos fazer a nossa parte e hoje iremos trazer um artista que tem DNA, Coração e Mente de Sambista.

 

Formador de futuros sambistas, Carlinhos do Salgueiro nos fala um pouco de tudo e sem pestanejar, nos conta todo o segredo do sucesso e da a receita para não deixar o samba morrer.

 

 

Confira a entrevista que ele nos concedeu e conheça um pouco mais sobre a sua história:

 

Como vc chegou no samba?

 

- Eu cheguei através de um rapaz que era segurança aqui do salgueiro, agora Diretor, o Clair. Eu vim para uma disputa de samba do Aprendizes do Salgueiro, aí meu irmão fez uma composição com a galera la do Andaraí e eu vim assistir, porque minha mãe não deixava eu participar, mas acabou que com meu irmão a gente desfilou no primeiro ano da Aprendizes. Ai eu vim para ajudar no samba do meu irmão junto com o meu amigo que é diretor de bateria e ai eu fiquei.

 

Você falou que sua mãe não deixava você no samba. Mas tem alguém da sua família que é do samba também?

 

- É. Minha mãe era do samba, só que minha era da Vila Isabel, mas eu era o filho mais novo e ela tinha neurose comigo. Ela sempre ficava com frescura comigo, para eu não me envolver com nada, porque tinha preconceito na comunidade, então ela não deixava, só acabou deixando por conta do meu irmão estava participando e eu ela ficava com essa coisa de me prender. Aí eu ia pra Vila Isabel, eu era muito novinho, brincava, mas eu só me identifiquei quando vim pra cá pro Salgueiro, foi quando cheguei aqui que meu coração bateu mais forte.

 

 

E você já trabalhou em outra escola também?

 

- Já. Já sim. Trabalhei sim. Indiretamente, logo quando entrei, eu coreografei uma Ala porque era um time de futebol e não me deram o Flamengo como eu queria e eu peguei uma camisa verde que me deram e acabou que a gente foi a sensação logo nesse primeiro ano. Ai eu fiquei 4 anos e depois fui trabalhar na escola Flor da Mina do Andaraí da minha comunidade, onde eu morava. Ai da Flor eu voltei pra cá, fiz um trabalho comunitário lá durante 10 anos e comecei a trabalhar coreografando aqui, depois eu trabalhei com a Viradouro, mas eu trabalhava escondido, eu coreografava os carros da escola, aí eu ganhei o Estandarte de Ouro e fiquei muito conhecido e não pude mais fazer o trabalho,mas já trabalhei com a Império da Tijuca, coreografei a comissão de frente, já coreografei a comissão de frente da Cubango e agora to trabalhando com a Tuiuti, trabalhei na Mocidade Alegre e fiz meu trabalho em Moscou, devido a esse sucesso, eu fui o primeiro coreografo brasileiro em Moscou, depois trabalhei no Festival Latino Americano depois eu fui pro Canadá onde ganhei uma faixa como Personalidade por conta de um personagem que eu fiz, o Madame Satã. E agora eu fui Rei em Londres.

 

Apesar de você ter um trabalho muito focado em Coreografia, o samba no pé você sempre prezou. Como é para você o trabalho de manter, no Carnaval, o Samba?

 

- Olha, eu sempre preservei essa coisa, eu acho que no Carnaval e em qualquer coisa que tenha dança a gente não pode perder a tradição. Eu vejo muita coreografia com muito balet e não concordo, eu acho que temos que ir sim fazer a viagem, as transformações, mas a essência é o samba. Eu devo isso a Minha tia, Marli, ela foi passista aqui do Salgueiro e ela sempre teve aquela malandragem toda do samba e ela sempre falou pra mim, eu sempre vivi e observei muito ela, então por mais que eu seja ousado, polêmico, diferente, eu sempre deixei prevalecer o samba. Então, eu acho que a gente tem que fazer nossas viagens, como eu sempre faço, mas o samba tem que estar presente.

 

Por mais que eu coloque um passo de dança, no final eu tenho que voltar com o samba, tem que ter o momento samba e eu fico feliz de ter se destacado tanto com a dança, mas por priorizar sempre o samba. Então esse ficou como sendo meu ponto forte, eu posso fazer a viagem que for, mas o samba é o ponto forte.

 

 

Saindo um pouco do seu setor. Bateria? Você acha que a bateria tem fugido muito do sentido samba com essas paradinhas, com essas bossas novas, até em muitos momentos “funkeadas”?

 

- Olha. Eu acho super válido. Gosto, eu to muito feliz que a minha bateria era um pouco acelerada e agora as baterias estão voltando um pouco para a tradição da cadência, não que aqui ela não fosse cadenciada, ela é sim. Eu gosto. Pra mim que uso da dança fica bem mais fácil a gente coreografar em cima da cadência e bossas, mas acho que cada um tem um gosto. Eu particularmente gosto, desde que tenha um momento para a gente poder sambar, mas não vou priorizar ou criticar, cada uma tem um gosto. Eu consigo aproveitar tudo de bom, tanto o lado da bossa, quanto o lado da cadência. Eu, Carlinhos, gosto, mas gosto do tradicional também. Eu gosto da Bateria de Mangueira e de vários outros mestres, eu tenho um coisa muito séria com eles, eu tenho uma relação com eles eu me dou bem com vários, Mestre Ciça (Ilha), Chuvisco (Estácio), com todos. Eu nem sei, eu acho que o respeito e a admiração pelo meu trabalho fez com que cada vez que vejo um eles me reverenciam, eles me cumprimentam.

 

O Ciça então é um “palhaço”, toda vez que me vê abre a bateria, o próprio Casão (Casagrande- Tijuca). Toda vez que estou num lugar e tem um mestre, eles me colocam para sambar a frente da bateria e eu fico muito feliz. O próprio Diretor da Vila Isabel, o Thiago que está lá na Grande Rio. Eu sou fã de todos, mas principalmente do meu Mestre Marcão, pois é graças ao meu Mestre de Bateria que eu sou o que sou hoje. Ele que acreditou em mim, ele que me deu a primeira oportunidade de mostrar o meu trabalho e essa oportunidade foi com a bateria no ano de Candaces (Enredo Salgueiro 2007), onde ele fez uma bossa e ele pediu que eu fizesse uma dança para aquela bossa dele. Graças a esse movimento e esse trabalho que hoje eu sou conhecido com Carlinhos do Salgueiro.

 

 

Fala um pouco pra gente do Projeto Samba no Pé.

 

- O Projeto Samba no Pé é um sonho. É um projeto que eu trouxe lá da minha Comunidade e ai desde que eu comecei a trabalhar com coreografia aqui a Regina realmente me apadrinhou.

 

Hoje o projeto tem muita criança, eu sou formador de muitas pessoas que vem pra cá, tem pessoas de outras escolas e agora estamos com uma formação de crianças, passistas mirins. É uma coisa que realmente me satisfaz. Eu venho pra cá muito cansado e aqui é onde eu pego a minha força para dar continuidade ao meu trabalho.

 

Aqui ensino postura, ensino show, ensino métodos para que a pessoa vire show, porque ser passista é ter muito amor. Ser passista pra mim é ser show, eu acho que ensino a elas, as pessoas que fazem o projeto saber que vão ser notadas, saber que vão ser observadas, então eles tem que estar cientes de que a gente é um artista. No samba não tem globo, não tem artista certo, os artistas da minha escola e dos meus trabalhos são os meus alunos e eu quero mostrar a eles que eles têm esse potencial e é o que acontece com o meu trabalho.

 

O pessoal pergunta muito: Carlinhos, qual é o segredo do Sucesso? Qual é o segredo de tudo? É o trabalho, é o ensaio, é o projeto e eu fico feliz que todo mundo que faz o projeto melhora.

 

Através do Projeto eu já ganhei 3 caldeirões (Programa Caldeirão do Hulk), 2 rainhas do Carnaval, todo saindo aqui do Projeto.

 

E como funciona o Projeto?

 

- O projeto é toda 3ª e 5ª, é um projeto patrocinado pela vila olímpica da escola, através da minha Presidente Regina. A gente faz a inscrição e as aulas acontecem das 19h às 21h a gente passa todas as noções. Aqui você fazendo a sua inscrição você faz o seu exame, você tem todo um aparato da escola para quem é do projeto. Esse é um dos trabalhos que eu mais gosto de fazer aqui dentro do Salgueiro. O Projeto é aberto para todo mundo, agora estamos mais focados em ensaiar show e desfile, em aprimorar quem vai desfilar, inclusive na escolinha mirim, mas isso aqui bomba o ano inteiro com muito Samba no pé e isso é muito gratificante pra mim em saber que esse meu trabalho tá melhorando o samba de muita gente e até a vida das pessoas.

 

 

Fale pro Foco in Samba como é ter iniciado no Salgueiro e hoje ter se tornado um dos ícones da Agremiação.

 

- É incrível isso !

 

Eu nunca imaginei isso na minha vida, eu cheguei aqui para observar um samba e eu gostei tanto. Eu acho que é o amor a resposta disso tudo, eu sempre me identifiquei muito com o que fiz, eu gostei tanto daqui que eu parei a minha vida. Tem 10 anos que eu não sei o que é Natal, não sei o que é Ano  Novo, eu passo Ano Novo trabalhando com a Escola, eu não sei o que é feriado, porque sempre estamos fazendo show com a escola. Então isso aqui se tornou um pouco da minha família e a resposta com o amor que eu passei.

 

Eu nunca imaginei ser uma referência pro Salgueiro, não foi a minha intenção, foi realmente a coisa do amor mesmo e a minha dedicação é que a resposta pra tudo. E fico feliz em hoje, até os meninos do cultural, falam assim pra mim, eu agradeço muito ao Paulinho, ele fala assim: “Carlinhos, você é esperado, você é a cara do Salgueiro, todo mundo quer te ver.” E eu não tinha esse peso, aí ele pegou e passou esse peso pra mim. Hoje em dia eu me preparo, hoje eu sei que eu estou sendo visto e isso tem o lado bom e o lado ruim, pois não posso fazer certas coisas, eu tenho eu me privar de coisas pra ser esse personagem “Carlinhos do Salgueiro”, então eu perdi muita coisa, mas ganhei muito mais. Graças a isso, hoje tenho uma casa legal, hoje eu tenho minhas coisas e hoje eu vivo do Carnaval. Então eu dei e recebi.

 

Eu agora não quero ser o Carlinhos do Salgueiro, eu quero ser o Carlinhos do Carnaval, quero ser útil a todos. Hoje eu tenho um carinho. Trabalhar com a escola, ver como faz o carnaval, ver o sacrifício das pessoas e eu quero ser conhecido com o Carlinhos do Carnaval, sendo útil pra todo mundo. Eu trabalho aqui, trabalho nos Grupos de Acesso, Escolas Mirins, Musas, Rainhas. Quero me tornar de verdade o Carlinhos do Carnaval, mas só em ser lembrado como uma pessoa Personalidade do Salgueiro, isso ... ainda não caiu a ficha. Eu estou sempre procurando fazer algo melhor para poder fazer jus a tudo isso.

 

E fale pra gente o segredo do Famoso “Carão”.

 

- hahahahahahaha. “Carão”, é uma coisa muito engraçada, ficou uma marca.

 

Mas eu juro, o “carão”, muita gente diz: Ah. Beyoncé !

 

Não tem nada a ver com ela, “Carão” é um defesa que a gente que trabalha com a dança, que a gente que é homem tem aquela coisa do preconceito e então eu me defendia. Simplesmente, para não ser agredido a gente tem que agredir. Então colocava uma expressão forte e quando o outro vê uma pessoa de atitude e força, as pessoas não vão denegrir, então eu vi que isso dava certo e eu comecei a usar muito isso para mim e eu sou muito carismático, eu sou muito expressivo e as pessoas que trabalhavam comigo acabaram pegando esse meu jeito de sambar com expressividade e foi ficando. Quando fui ver, as crianças, os adultos, estavam todos com essa força e aí ficou “Carlinhos Carão” e foi ficando meio que uma marca e agora não consigo mais largar. Eu agora brinco com essa história e sempre que as pessoas pedem pra fazer foto aí eu grito: “Não ri não ! Faz “Carão” !” essa é a minha marca, Carlinhos “Carão”, “Carudo” e eu não sou o que aparenta ser nas fotos, só que por conta de tantos anos com essa expressão ficou uma marca e hoje eu me divirto com isso.

 

O que o Carlinhos tem a dizer para seus alunos e fãs?

 

- Olha. Eu quero deixar uma mensagem sim.

 

Eu acho que todo mundo é o que faz. Você é o que você planta. Pra ganhar tem que perder, é meu ditado. Eu quero dizer para todo mundo que não gosta de mim que antes de falar qualquer coisa, venha saber um pouco de mim e da minha história, saber o que eu fiz, o que eu fui e o que eu vou fazer ainda e pra quem gosta de mim eu agradeço de coração o carinho, aonde eu vou eu sou reconhecido, é médico, é no mercado, é no banco. Eu quero agradecer a todo mundo por esse carinho e quero dizer que o Carlinhos está aí pro que der e vier, acho que Deus me deu esse dom de trazer alegria e eu quero mostrar ainda mais o meu potencial. Obrigado de coração a todo esse carinho !

 

Nome completo: Carlos Borges

 

Idade: 40 anos

 

O que você faz? Sou professor de samba, diretor do Grupo Show do Salgueiro e trabalho como coreógrafo de alas no Salgueiro.

 

Uma Música: “Ele Vive” de Leonardo Gonçalves

 

Comida preferida: Frango com batata doce

 

Um Lugar: Porto de Galinhas

 

O seu “hobbie”: Ver televisão

 

O seu time de futebol: Flamengo

 

Sonho: Ter um Projeto Social na comunidade aonde eu nasci.

 

Em nossa visita podemos conhecer também uma pessoa muito importante na Vida pessoal e profissional do Carlinhos, chamada de Mãe por ele, Laudicea Ramos nos conta um pouco de como é o seu trabalho com Carlinhos e nos fala um pouco do sentimento por esse filho:

 

Carlinhos é um filho do coração que eu adotei, ele entrou na minha vida e é uma paixão. Admiro o profissional que ele é, uma pessoa maravilhosa, entrega total, dinamismo dele, a força de vontade, determinação, isso só me faz admirá-lo cada vez mais. É muito bom ele permitir que eu faça parte da vida dele, é um presente. Porque é uma pessoa que eu convivo, que eu amo e admiro muito pela força dele e gosto muito de estar com ele e ver a transformação que ele faz na vida de muita gente. Vejo crianças, adolescentes, adultos chegarem aqui cru e saem com uma profissão que é a dança e ele não tem medo de ensinar, ele ensina o passo a passo, ele ensina tudo com uma perfeição, com uma técnica. Eu já tive a oportunidade de trabalhar com outros profissionais, mas ele é diferente. O amor que ele tem pela dança é o que faz ele ser diferente. Eu sou muito feliz e tenho muito prazer em poder estar participando disso com ele.”

 

 

Entrevista/texto: Alexander Soares (Foguinho de Vaz Lobo)

 

Fotos: Rogério Neves

 

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